terça-feira, 17 de agosto de 2010

O Fio da Verdade



Como uma aranha que nas aéreas pilastras constrói engenhosamente sua teia, alguns homens dedicam-se a liberar pequenos fios do saber, na esperança de produzir e alcançar o que batizam de verdade. Tais fios, finos num primeiro instante, aumentam de espessura a cada vez que eles se esquecem da multiplicidade do mundo e do caráter distintivo do particular, na tentativa de atrair presas para um universo de abstração e ordem.

Devemos levar em consideração tais construções humanas a que chamaremos de conceito, na medida em que as percebemos como proteção aracnídea. Ora, nos é necessário um aparato de saberes, ainda que genérico, para que possamos nos firmar e inaugurar nossa subsistência! Temos tal aparato para não sucumbir ante a ilusão. Entretanto, cabe perguntar se, edificadas sobre a fragilidade, nossas teias conceituais nos levariam necessariamente a uma verdade pura.

- O que é a verdade? - perguntariam alguns leitores. E dentre todas as possibilidades, eu poderia responder: - é a capacidade humana de produzir assimilações e dissolver imagens em conceitos; é a teia da aranha.

- E o que são os conceitos? – perguntariam outros. E mais uma vez, eu poderia responder: - são proteções humanas que nos sustentam contra o desconhecido; são os fios da teia da aranha.

Partindo do pressuposto de que minhas respostas não conduzem, aqui, necessariamente à verdade, e sem descartar a função vital de nossas arquiteturas do saber, sugiro a todos um exercício artístico: teçamos modelos inteligíveis, como aranhas férteis que somos, mas sem, no entanto, deixar escapar o instinto criador que se oculta por detrás desse emaranhado, e sem ter medo daquilo que não se entende por verdade.

As aranhas transcrevem um mundo ao erigirem teias de seda, mas a natureza nada sabe sobre conceitos. O homem, se tomado como um sujeito criador de verdades poderia erigir universos sem grades, livres do medo do devorar predatório, aceitando a vida em todos os seus aspectos, aceitando tanto a verdade quanto a mentira, deixando de ser apenas um sujeito conhecedor. Eu diria que o homem é justamente o animal conhecedor da mentira e da conveniência, mas não posso negar que ele é também aquele que melhor traduz essa relação estética entre o conhecimento e a vida.