quarta-feira, 29 de junho de 2011

Os Idiotas


Somos de um tipo raro. Não temos direitos, nem deveres, ou quaisquer benefícios. Somos assistidos, diariamente, por nossos representantes, sem que precisemos agir ou questionar. Não sabemos por que estamos aqui ou para onde iremos. Só sabemos que estamos e que, um dia, iremos.

Contam-nos, desde pequenos, que estamos crescendo num ambiente repleto de democracia, liberdade regulamentada, respeito e mútua solidariedade. Restringem nossas mínimas escolhas, enchem os nossos ouvidos de esperança, caçoam de nossos gestos débeis, riem das nossas curtas memórias, embriagam-se com a nossa estupidez. Não nos permitem que sejamos nós mesmos – seria ridículo demais.

Somos esta leva de insuportáveis, de párias ambulantes, transeuntes indesejáveis. Comportamos a insustentável diferença que separa, a fisionomia que assusta, a ingenuidade digna de pena. Somos estrangeiros desde que nascemos; portadores de uma anomalia que jamais será curada. Somos os idiotas!

Mas, se acalmem! Não somos possuidores de uma idiotia qualquer. Somos raros, lembram-se? Resgatamos a pureza do príncipe Míchkin, de Dostoiévski, que sofria em razão de sua bondade excessiva. É que, no mundo, o homem bom é um idiota. Idiota no sentido antigo do termo: isolado, solitário. É um estrangeiro imbecil, que insiste em ser alheio ao homem de Estado.

Mas a nossa sagaz idiotia também nos remete à imagem do satírico Nelson Rodrigues, quando pensamos nos vários outros tipos de retardos. A gravidade da doença é tamanha, que já não há espaço para o discernimento. Há outros tipos de idiotas, todos iguais em ignorância e pretensão, que andam por aí em suas belas vestes e se esbarram no Planalto central, como se possuíssem a sobriedade necessária para comandar essa idiota que vos fala.

Esses parasitas condecorados, esses deficientes de caráter, nos sujeitam aos mais perversos tratamentos, sob o pretexto da cura e da normalidade.

Esse segundo tipo de idiota, o mais perigoso, eu diria, gerou, ainda, um terceiro tipo, o mais asqueroso: aqueles que, nas palavras do próprio Nelson, foram chamados de “falsos cretinos”. Eles são maioria e se escondem, com a habilidade sorrateira de uma toupeira, nas casas mais simples, nos ofícios mais comuns.

Acontece que o Brasil está repleto de “falsos cretinos”, desses idiotas que agem da mesma maneira que os idiotas de Estado, corrompendo, aos poucos, o que resta de belo na estupidez dos raros.

Estamos sendo invadidos por idiotas clandestinos e ninguém está imune às tolices.

Somos o país dos idiotas e não sabemos o que é felicidade.