segunda-feira, 5 de maio de 2008



A razão me atinge como um pássaro.
Ainda pequena, precisa dos meus cuidados.

O corvo estirado nos cercados de minha individualidade espreita a frieza a que me convidam os batedores de asas. Sobrevivente o corvo, ele se torna cansaço, ao bicar as gaiolas de minha consciência prematura, contrariada por não se fazer transbordar.

Faço das penas frias travesseiros, ao pender a cabeça e fechar os olhos.

Releio os diálogos de minha vida dormente e precipito-me em adotar minha subjetividade constatadora. Ela é negra como o corvo.

Os abutres da realidade insistem em me invadir e, com suas asas, delicadamente se jogam aos abismos das minhas vontades. Sem perceber, disparam conceitos e fronteiras. Restringem-me.

Começo por soluçar vôos que tendem a ser esmagados pelo vento do soprar diário. Tentativas de cair, assolam-me. Ao primeiro encontro, regorgitam-me expectativas alheias.

A visão aguçada, obtida pelas observações a que me proponho, perdeu-se nas margens do que sou. Os limites me cortam, as exatidões nauseiam.

Não poderia impor racionalidade a esses trechos, insignificantes, de pouso forçado.
Que sei de mim? Cercada por esse inconstante emaranhado de letras pretas, arriscando compreensões relativas e infinitas?

Termino por colar nas paredes do meu ser as idéias traduzidas, as lembranças transfiguradas, as verdades contraditórias, minhas suposições de delírio e sangue, de ave sem liberdade.

Nasço da possibilidade que tenho de imaginar um mundo sem mim. Convivo com a certeza de deixá-lo a qualquer tempo.

Ao me afastar da entrada da gaiola, vejo planar no horizonte a aurora da minha vida.
E me torno veloz, absurda, realizada e feliz.