quarta-feira, 28 de abril de 2010

Empédocles de Agrigento (495/435 A.C.)

1. A Vida de Empédocles e seus fragmentos em "supostos" dois poemas: "Sobre a Natureza" e "Purificações"

[...] Os homens vêem apenas uma pequena parte de uma vida que não é vida, condenados a prematura morte, são roubados e diluem-se como fumaça (frag. 2) .

1.1. Empédocles surge ao cenário greco-ocidental, permeado pelo interesse cosmológico dos pré-socráticos, de um modo um tanto quanto enigmático. Seus biógrafos e estudiosos são sintomáticos e unânimes ao identificarem esta esfera sombria da sua personalidade e a dificuldade de se estudar seu pensamento, sobretudo pela pelas particularidades morfológico-semânticas de seu Léxico. Dentre os vários autores, citamos Gerd Bornhein e Barnes, pois eles atestam exatamente o caráter lendário da vida de Empédocles, como também de Anaxágoras, como néo-jônios.

1.2. Muitas situações relativas a Empédocles ilustram historias inusitadas, mas é, sobretudo, em narrativas que evocam certo tom de “xamanismo” sobre sua pessoa que repousam os mais apofáticos e típicos comentários. Em certo contexto, por exemplo, ao libertar uma cidade da malária foi aclamado “deus” como nos afirma o próprio Bornhein . Entre outros tantos exemplos que iremos calcar ao expor nossa argumentação, Empédocles surgiu ao cenário cosmológico com uma novidade – seu pensamento foi cadenciado pela argumentação arque típica na physis, mas de maneira pluralista. Deste modo, obviamente concordo com G. Reale, que o denomina como “um físico pluralista” , porque de certa forma, segue a todos da formação pré-socrática, bem como os de formação eleática , pois se une na procura da arché na physis, não de maneira moonista, mas, como já dissemos, sua doutrina é complementarista, sem, contudo afirmar uma gênese antecedente entre as raízes elencadas por ele. De certo modo, sendo pluralista e, ao mesmo tempo, reiterando a unidade parmenidiana com o devir heracletiano, Empédocles encontrou mais de um elemento constitutivo em todas as coisas no cosmo.

1.3. Empédocles nasceu entre os anos em 495/90 a.C, na cidade de Agrigento, cidade de origem Dórica, na região da Sicília; e teria morrido entre os anos de 430/445 a.C. Era proveniente de família aristocrática e influente; o pai era o político e aristocrata Méton, e consequentemente, tanto ele como sua família participavam das atividades políticas da pólis. Era um homem da política - “da fala publica”, ou, como nos afirma “Aristoteles [...] que o considerava o pai da retórica” admirado pela arte de falar.

1.4. Enfim, Empédocles era admirado pela sua postura de falar em público. E assim sendo, ao acompanhar o artigo "Empedocles'Oral Style", de Jackson Hershbell, informo que temos respaldos para crer que Empédocles foi um dos maiores oradores de seu tempo, e que, de fato, seus poemas eram recitativos - funcionariam apenas como "anotações", uma vez que tudo era proclamado para a audiência, o público.
Em razão de sua extraordinária habilidade técnica e oratória, sua cidade natal passou admirá-lo e a considerá-lo um homem de talentos sobrenaturais, divinos. Também encontrei relatos de que ele teria curado certa praga da cidade de Atenas, usando apenas o fogo. Ele teria feito o mesmo em sua terra natal com o método de desinfecção pelo fumo: “αψεως πυρων δι ‘καιυποκαπνισμων”. Viajou por muitos lugares e faleceu, mais ou menos aos sessenta anos, segundo a doxografia, em local ignorado (Peloponeso ou Túrios).
Ademais, nada se conhece de concreto a respeito de sua vida como afirma, especialmente, Jean Bollack – um dos principais referenciais. Tendo vivido em Agrigento, na Sicília, deve ter morrido provavelmente em 435 a. C e, além disso, era considerado venturoso tanto como médico, poeta, dramaturgo, político e investigador da natureza, filósofo e "deus".

1.5. Suas obras contemplariam, supostamente, dois poemas, dos quais resta-nos alguns fragmentos que foram conservados e transmitidos ao longo dos tempos. Ele observou que plantas e animais, o mundo físico, o cosmo, incluindo o homem, são criados a partir de quatro elementos básicos, que ele chamou “ριζ? Ματα” (raízes ou elementos). Este é, pois, o elo que o liga à todo o interesse pré-socrático e ao mesmo tempo é o que o distancia, pois sua finalidade é pluralista. Quando combinados em maneiras diferentes, esses elementos conseguem produzir todas as variedades de espécies vegetais e animais na Terra. A “mistura” destes quatro elementos descreve cada órgão ou parte do nosso corpo, cada fragmento do Universo. Segundo Marcelo Perine, o “múltiplo” é a primeira constatação que temos, e, neste sentido, Pitágoras, Heráclito e Empédocles estavam corretos, pois não partem de uma unidade primordial, mas da constatação real da multiplicidade.

1.6. Em geral, sua introspecção, vista através de suas observações, revelam uma biomédica admirável, de modo que poderíamos chamá-lo de "precursor da medicina moderna". Empédocles foi o autor de, supostamente, dois poemas em hexâmetros, um físico-cosmológico tradicionalmente intitulado “Sobre a Natureza” (estimado ter sido de 2.000 a 3.000 linhas de comprimento - Há divergência entre os intérpretes) e um religioso, místico, denominado de ”Purificações”, cujos temas variam desde a salvação pessoal (incluindo listas de tabus, metempsicose, e escatologia) à percepção sensorial. Estimam-se um total de 450 linhas para os dois poemas, os quais seriam a maior quantidade de texto disponível para nós de qualquer pré-socrático. Tais fragmentos foram conservados, principalmente, sob a forma de citações de autores posteriores (doxógrafos: Simplício, Aristóteles, Plutarco, Diógenes Laércio, entre outros). Também a ele foram atribuídos: um tratado sobre medicina, tragédias e outras obras, mas as fontes não nos dizem nada sobre o conteúdo de quaisquer destes documentos, e estudiosos modernos, em geral, crêem que as imputações eram falsas ou confusas. É imperioso salientar, no entanto, que Empédocles é frequentemente citado como um médico pelos escritores de medicina (Galeno se refere a ele como fundador da escola de medicina siciliana).

1.7. Empédocles, como vimos, seria de origem aristocrática, e teria participado do movimento contra o tirano Trasideu e da denominada Assembléia dos Mil, defendendo a democracia instaurada na sua cidade. Parece ter sido rico e amante de teatro, poesia, esporte e política. Um homem eclético, talvez. Sua filosofia consistia, basicamente, em defender que na natureza existe uma lei imutável. Por ter lutado contra a tirania, teria sido expulso e, por isso, teria passado a vagar, errante, pela Grécia. Deste modo, ele teria tido contato com muitas doutrinas e influências religiosas e filosóficas, como veremos em breve. Uma de suas principais contribuições fora a idéia da “lei da evolução”: "Empédocles definiu que as espécies originam-se uma das outras e que só as mais aptas permanecem em função da seleção natural (processo de atração pela semelhança)”.

1.8. Empédocles parecia crer que tudo o que existe tem origem na combinação e mistura de quatro elementos: água, terra, fogo e ar. A estrutura de sua “teoria” física segue o conhecimento de seus predecessores: Tales, Anaximandro, Heráclito, Pitágoras e Parmênides. Obviamente estão inclusas as idéias religiosas e místicas do dionisismo, do espírito trágico, mas, sobretudo do pitagorismo-órfico. Entre os quatros princípios, a água, a terra, o fogo e o ar, não existiria, nenhuma hierarquia, ou seja, nenhum deles é mais importante ou anterior que o outro: todos estão no mesmo plano. Para que o mundo produza a sua diversidade, esses quatro elementos se unem e se separam, devido a duas forças cósmicas opostas: o Amor (Éros) e o Ódio (Neikós). O Amor que une e o Ódio que separa. Entre essas últimas forças citadas também não haveria hierarquia, pois ambas teriam como destino alternarem-se eternamente e tudo seria constituído a partir da ação dessas forças em movimentos cíclicos. Enfim, não é difícil percebermos no pensamento dos filósofos pré-socráticos concepções acerca da natureza, subjacentes às teorias científicas modernas: o átomo de Demócrito, os quatro elementos e o dualismo amor/ ódio de Empédocles, o movimento e o devir de Heráclito, a geometria de Tales, etc.

1.9. Os autores Kirk, Raven e Schofield na obra: “Os Pré-Socráticos: História crítica com seleção de textos” no capitulo X, tratam dos fragmentos de Empédocles. O primeiro aspecto abordado pelos autores versa sobre a vida deste filósofo. Dos números marginais 332-336 (p.293-294), tanto em grego como suas respectivas traduções em português trazem a tona aspectos da doxografia do filósofo, sobretudo nos relatos de Diógenes Laércio, Aristóteles e Simplício. O mesmo em referência às obras, que na verdade são seus dois poemas. Neste âmbito também Diógenes Laércio é uma referência, ao lado do autor denominado Suda.