domingo, 23 de setembro de 2007

Continuação do texto anterior, escrito aos 17.

A árvore dos sonhos

A garota da janela virara árvore... e sua história não foi das mais belas.
Não tinha agora seu companheiro Bee. Possuía apenas a solidão como eterna e inseparável amiga. Amiga de todas as horas...
Nasceu! Veio por baixo e era, então, uma muda, um brotinho. Seus galhinhos finos, quase imperceptíveis, pareciam tão frágeis ao vento, mas eram de um verde de invejar os mares! Suas folhas eram pequenas, confesso, mas encantadoramente saudáveis e cheias de vida.
Aquilo incomodava as plantas ao seu redor. Como poderia um vegetal tão pequeno e insignificante ser tão belo e tão digno de tamanha dedicação? Não havia como compreender aquela "injustiça". A garota que virara planta precisava ser exterminada e não seria tarefa difícil. A plantinha pequena e inofensiva fora plantada em local inapropriado. Diziam - as más línguas - que ela não agüentaria por muito tempo. Terra ruim. Mas nem fora esse o pior dos problemas da pequena.
Sua tragédia iniciara quando viu pela primeira vez um pé. O pé havia lhe pisado com tamanha força que havia lhe deformado; a planta estava completamente torta e machucada. Tudo por causa de um tênis que lhe veio a acertar o caule, as folhas e o coração.
Felizes, as outras plantas tinham certeza de sua morte, mas, para desgosto geral, a pequena planta renascera. Com toda sua força ela sobreviveu àquela pisada na alma e se reergueu mais bela e forte do que nunca. A garota-planta tinha plena convicção de que chegaria a ser árvore, só não sabia de que espécie... não importavam os outros, a terra ruim, os maus ventos ou qualquer coisa do tipo. Ela sempre enfrentaria.
Depois de recuperar-se totalmente, a plantinha continuou a crescer. Já tinha médio porte quando o vizinho resolveu podá-la. Cortou seus galhos e lhe deu uma forma redonda, feia. Ela virara um enfeite... e as outras, as outras riam! Riam de sua função (não desejada) e de seu formato. Não importava o que a árvorezinha era, mas, o que ela aparentava ser... E a pequenina jamais desistiria. Iria até o fim.
Algum tempo se passou e a garota-vegetal se ergueu mais um bocado. Era agora uma árvore enorme, com folhas largas, flores ao seu redor e frutos que alimentariam o mundo (se preciso fosse). A tristeza era a de que chegara o outono e o inverno. Não houve folha que resistisse à tanta frieza. Galhos congelaram-se. E ela ficou nua e só. Feia. Fria. Apenas ela e ela, somente.
Depois, tudo melhorou e voltou a ser como antes... a primavera! Tudo voltara a ter o mesmo vigor, a mesma magnitude, a mesma perfeição. Era sempre assim: um ciclo; um dia perdia, outro ganhava.
O problema era outro. Plantas dão muito trabalho. Era necessário varrer a calçada todos os dias, pois as folhas faziam muita sujeira. As frutas podres não eram belas. E os pássaros que a pequenina abrigava com tanto amor, não eram tão educados assim. Sem contar que o tamanho da garota da janela assustara. Seus galhos se enroscavam no fio de luz. Gastava-se dinheiro. Melhor seria dar um fim.
O último som que a pequenina ouvira foi o da moto-serra. A última imagem que pra ela brilhou fora a de seus frutos morrendo, suas folhas caindo e seu tronco sendo partido ao meio. E a coitada não entendia o porquê de tamanha brutalidade. Ela não havia feito nada, nem havia pedido para existir. Ela só queria estar ali e crescer em paz. O último cheiro que sentiu foi de suas flores companheiras dizendo adeus. O último toque foi para proteger o pássaro. O último gosto foi o do veneno da morte...
E fez-se festa no pomar.