domingo, 23 de setembro de 2007

Esse texto é o relato de um sonho de morte, que tive, ano passado:

Era uma comemoração barulhenta e aparentemente sem motivos.
Beirava o nada.
Esses hábitos hedonistas, quase pagãos, de culto ao Deus Baco, à danças estranhas, eram-me agradáveis, mas não naquele momento.
Tudo o que eu sabia era que tinha de partir.
Eu desejava apenas, ansiosamente, ir-me.
Cômico! Todos estavam presentes mas ninguém sabia onde estávamos.
Saí correndo por aquele lugar desconhecido, a procura de uma saída, a procura de alguém que me tirasse dali. Ninguém me dava ouvidos.
Numa espécie de conluio, todos pareciam estar decididos a ignorar a única que queria deixar aquele lugar.
Um estranho lugar escuro, rodeado de árvores altas, que se iniciava numa rodovia e terminava num sobrado. Na casa: a festa que não terminava nunca e as pessoas que não me deixavam ir.Na época, havia uma pessoa que eu gostava bastante e que eu estava certa de que me tiraria dali. Encontrei um telefone estranho, que mais se parecia com um chaveiro, e telefonei para aquele que era uma esperança. Mas a ligação não se completava...
Eu sequer sabia onde estava.

Desesperada, quase a chorar, subi os degraus daquele lugar horroroso, em busca de uma informação, um alguém, uma fuga e deparei-me com uma escada já conhecida, com os degraus da minha infância, da casa que sempre morei.
Sem controlar meus movimentos, fui obrigada a subir estes degraus.
Fui levada até o quarto de meu irmão e, sem saber o porquê, abri a janela de madeira.

Chovia forte. O céu cinza-escuro parecia não querer existir e se dissipava em pequenas partículas de vida. As gotas caíam com tamanha força que não se ouvia nada além do som daquele réquiem.Entretanto, um outro som, ensurdecedor, se fez.
Um clarão sorriu naquele céu de sombra, e eu pensei que se tratava apenas de mais um encontro entre duas nuvens cinzentas perdidas na luta da transmutação.Mas não era isso.

Quando dei por mim, a chuva tinha cessado e o azul estava voltando.
Percebi, então, que havia algo sobre a minha cabeça.
No telhado, havia um tic-tac, como o de um relógio, a tirar-me o sossego e a vida.

O tempo, meu amigo arredio, brigava comigo.
Era uma bomba-relógio.
Em qualquer segundo ela explodiria e levaria aos pedaços todos os outros segundos que me eram de direito.
Explodiria e exibiria os cacos, os restos, os estilhaços, o pó.
Corri contra o meu amigo.
Mas como todo os "amigos" que tive, ele me deu as costas, deixando para trás o punhal.
Ao tentar voltar, flutuei sobre os degraus, mas ele empurrou-me para o abismo.
O tempo explodiu!

Além dos cacos, do pó, me vi estirada no chão, toda suja e ensangüentada, com ossos rasgando-me a carne e a poeira ainda a baixar. Senti o calor saindo do meu corpo e o sangue a parar de correr, lentamente, conforme meu amigo determinou.

Morri.

Morri, quando meu amigo partiu, sem perceber que não havia abandono, (é esse o grande temor humano! Não é a solidão que se teme, é o abandono) sem perceber que a partida dele realizava o grande desejo que eu tinha em não mais presenciar a grande festa dos que nada sabem.

Agora compreendo o conceito de amizade.